sábado, julho 04, 2009

A CRUZ ANDINA



A Cruz Andina

Segundo o professor Carmona, chefe do Departamento de Sociologia, Antropologia e Arqueologia da Universidade Abad de Cusco, o mundo era dividido em duas partes por uma linha horizontal, uma superior – Anan – e outra inferior – Urin. A barra horizontal simboliza a dualidade, a parte de cima é positiva, ou mundo de Wiracocha, simbolizada pelo sol e a de baixo é negativa, o mundo de Pachamama, a mãe terra. Há sempre, na Cosmologia Inca, uma dualidade, o masculino com o feminino, o positivo com o negativo, o céu e a terra. Estes mundos, de acima e abaixo, eram também divididos em duas partes, formando um mundo distribuído em quatro quadrantes. Estas duas linhas, uma vertical e a outra horizontal, formam a Cruz Andina.
A Cruz Andina, um símbolo presente em todas as culturas pré-colombianas, representa tanto o mundo material, quanto o espiritual. No sentido espiritual o lado direito simboliza esta vida e o esquerdo a outra vida. O povo andino não acredita na morte, ninguém morre, quando se sai desta vida entra-se em outra. Como símbolo disso, antes da invasão espanhola, as pessoas nobres, quando morriam, eram mumificadas na posição fetal, porque nesta posição ela já estava pronta para entrar no útero de outra mãe. Esta cruz possui outros significados, simboliza também as quatro estações e servia para formar o calendário Inca, pois cada uma das barras está relacionada com o solstício e o equinócio do sol que marcam as quatro estações do ano. O mês Inca não era lunar, mas sim solar, cada mês tinha 45 dias e era acompanhado pelo sistema da cruz Andina. Nestes quadrantes eles marcavam o caminho do sol e sua relação com as energias da natureza. Sabiam as épocas para arar a terra, semear, o florescimento e colheita de cada espécie de vegetal que cultivavam. Isto também se aplicava aos animais e homens.

Utilidades da Cruz Andina

O mundo espiritual também era representado por símbolo e cada entidade ou divindade tinha sua posição num destes quadrantes. O Deus maior era Pachacamác, ou Wiracocha, que era andrógino, isto é, possuía tanto a energia positiva, quanto a negativa. Ele é percebido no mundo através de suas manifestações que podiam possuir as características positivas (ou masculina) e negativas (ou femininas), como o sol e a lua, o céu e a terra, o fogo e a água. Neste ponto existe uma semelhança fantástica com o Yin e o Yang do Taoísmo. Segundo o professor Carmona, esta cruz era dividida em subquadrantes que formavam o calendário agropecuário dos Incas. Desta forma, o ano tinha 8 meses e cada mês durava aproximadamente 45 dias. Este calendário seguia a trajetória do sol e era acompanhado pelos relógios solares espalhados pelo Império. Cada intervalo de 45 dias era apropriado para um determinado tipo de lavoura ou pecuária. Então, pela posição do sol em determinado quadrante de 45º, eles sabiam o que devia ser feito naquele período. Esta cruz servia também para acompanhar o movimento das estrelas que tinham influência na agricultura. Aa fases da lua regiam as atividades humanas, como a menstruação das mulheres, corte de cabelo, relações sexuais, casamentos, etc. Por exemplo, no miguante não se fazia nada de importante como casamento, sexo, decisões pois este período estava associado com a morte ou fracasso. Os três níveis também se encaixam nesta cruz, o plano do puma está na barra horizontal e possui sua infuência nesta e na outra vida. O plano do condor está acima da barra horizontal simboloza o Cosmos, ou plano superior, onde está o sol e Wiraccocha e está relacionado com o plano espiritual. Na parte inferior está o plano da serpente, que representa o mundo dos espíritos e da morte, onde está a lua e Pachamama, é o mundo das sombras e dos espiritos desencarnados. Eles acreditavam que algumas pessoas deviam passar algum tempo neste plano se preparando para uma nova encarnação em outro ventre. Esta cruz possui uma série de outras aplicações, inclusive para rituais xamanísticos. Todos os rituais místicos andinos utilizam esta cruz, pois ela representa a cosmologia andina e serve para atrair as energias espirituais envocadas na cerimônia. Os sacerdotes andinos já praticavam, há muitos séculos, o espiritismo em suas diversas formas, atingindo o seu ponto de maior desenvolvimento no Império Inca. Toda a cosmologia exposta pela Cruz Andina é tão rica, transparente e verificável, tanto na natureza quanto no cosmos, que não deixa nenhuma brecha para dúvidas a serem preenchidas pela fé. Não existem dogmas, tudo é explicado pelos elementos naturais da região andina. Uma coisa está ligada a outra e, desta forma, os conceitos se desdobram numa malha de idéias estruturadas em camadas, ou níveis, tanto no plano físico quanto espiritual. O mais importante é que não existe uma filosofia ou uma doutrina de conduta para os homens, esta cosmologia não se preocupa com isto, ela apenas descreve o mundo e suas várias dimensões, tomando como elemento os próprios fenomenos físicos, psíquicos e espirituais deste mundo. Tudo possui um ponto de amarração e referência com a realidade terrestre. Esta cosmologia não é abstrata e nem é ideológica, ela parte da experiência empírica, da observação do concreto para expor um quadro que explique o mundo, de forma que o homem saiba como viver da melhor maneira nele. Estando consciente destas leis naturais, o homem andino submete-se a elas com humildade e respeito. Ele sabe que sua vida está regida por forças superiores a ele mesmo e às quais ele pertence com perte integrante. O equilíbrio do Todo depende da sua relação com estas energias. Caso ele viole este equilíbrio, as conseqüências podem ser sentidas através de doenças, desarmonia no lar, prejuízos nos negócios, etc.












Acima são mostradas algumas figuras encontradas em cerâmicas Incas. Observe que são todas variações de um mesmo motivo: A Cruz Inca e a subdivisão do mundo em quatro partes. Volta topo

As pirâmides e a Cruaz Andina

Na América pré-Colombiana já haviam construções de pirâmides, cujos princípios eram os mesmos das que foram construídas no Egito. As pirâmides, tanto as do Peru Antigo, quanto as de outras culturas, possuiam os três níveis representados nas suas construções.
Algumas eram construídas com três platôs (ou múliplos deste) sobrepostos, no formato de escadas, outras com três elevações em forma de U, como as das culturas pré Chavin. As mais comuns tinham três câmaras, como as do Egito, México e Chimú. O número três, simbolizando os três níveis, estava sempre representado de alguma forma. Em cada nível era realizado um ritual específico. Na câmara do Puma era realizado um ritual com a finalidade de desligar o corpo e o espírito do mundo dos vivos. Neste ritual o corpo era mumificado e o cadáver preparado para os rituais da Serpente e do Condor. A câmara da Serpente ficava no subsolo e era dedicada ao mundo dos mortos, onde o defunto era entregue ao mundo da Serpente, à Mãe Terra, através de um ritual específico.



Depois de entregue e aceito pela Mãe Terra, de onde viemos e para onde voltamos, o corpo mumificado era levado para a câmara do Condor, ou mundo dos espíritos, de onde poderia ir para a outra vida, seja neste mundo ou em outro melhor. Todas as pirâmides possuem a divisão do mundo acima e abaixo, sendo que sua construção é simétrica, o solo é a linha que separa estes dois mundos, representando o plano do Puma (ver figura abaixo).



As múmias são encontradas sempre na Câmara do Condor (câmara superior), simbolizando que o espírito que habitava aquele corpo pertence agora ao Mundo de Acima. Na parte de baixo podemos encontrar oferendas e objetos cerimoniais que foram utilizados no ritual de entrega do corpo à Mãe Terra. Além disto, esta câmara pode conter pertences do morto e, as vezes, pessoas como parentes e criados. Em alguns casos estes objetos encontram-se junto à múmia, na Câmara Superior. Acreditava-se que as pessoas enterradas junto com o defunto poderiam fazer-lhe companhia, servir e protegê-lo na travessia que o morto faria ao outro mundo até a próxima vida. Na América do Sul as múmias, em sua maioria, eram enterradas na posição fetal, de modo a facilitar o seu próximo renascimento em outro ventre. Volta topo

As funções dos “andenes” Incas

Outra coisa interessante e que muito me intrigava eram os platôs, ou “andenes” muito utilizados no Peru Antigo e ainda hoje. Eles possuem três funções:

Contenção de encostas e aproveitamento do solo para agricultura;
Fortificação e defesa de pontos estratégicos militares;
Símbolo religioso de ascensão espiritual.


Nos três casos os “andenes” incluem o simbolismo da fertilidade e progresso nos três níveis: o da serpente representada pela Mãe Terra que produz os alimentos, identificado pela forma sinuosa dos andenes; o do Puma, ou mundo dos homens, da força e controle da terra, identificado pela superfície plana do platô; o do Condor, ou mundo da espiritualidade, da energia cósmica que influencia e rege tudo, identificado pela sucessão de muros em escada. A vida no mundo andino baseava-se num eficiente controle dos meios de produção de alimentos. Este sistema de controle estava diretamente relacionada com estes três níveis, pois a terra produzia seus frutos, desde que algumas condições naturais e sobrenaturais ocorressem. Para garantir o uso da terra era necessário administrá-la com sabedoria, além de manter e defendê-la contra a invasão de outros povos. Volta topo

As divindades andinas

Os fenômenos naturais, no plano do Puma, que poderiam afetar a produção agrícola e agropecuária, tais como chuvas, secas, frio, geadas, terremotos, ciclos solares, lunares e estrelares eram fenômenos cuja ocorrência e intensidade eram ditados pelas forças que pertenciam a um mundo mágico, dominado por espíritos e energias espirituais da natureza. Além disto, acreditava-se que estas forças tinham, também, grande influência nos sucessos militares e na boa gestão do Estado. Os povos antigos dos Andes não cultuavam entidades como São Francisco, São Jorge e ouras, mas sim entidades míticas que simbolizavam as forças primitivas da natureza como o Sol, Vento, Água, Terra, Raio, etc., muito semelhante ao sistema chinês do Yin e Yang. Para eles o mundo deveria estar em perfeito equilíbrio com as duas forças básicas do universo, a negativa e a positiva e, quando isto não ocorria o resultado eram as secas, enchentes, terremotos e outros fenômenos. Para resolver isto, sempre que ocorria uma catástrofe, realizavam rituais com oferendas para equilibrar estas forças. Acreditavam que a energia gerada por estes rituais provocariam um retorno ao estado de equilíbrio. Haviam também rituais advinhatórios que eram realizados antes de um cíclo agrícola, uma aventura militar, no início do ano solar (no solistício do verão). Estas cerimônias, associadas a um avançada ciência astronômica, permitiam prever as condições adversas, tanto da natureza quanto sociais, e serviam, segundo suas crenças, para avisar sobre possíveis desequilíbrios das energias cósmicas que pudessem resultar em fracasso. Para prevenir os seus efeitos destruidores destes desequilíbrios eram realizados outros rituais, que envolviam sacrifício de animais e até de crianças, com o intuito de restabelecer o equilíbrio. Volta topo

Os sacerdotes andinos

Eu estava tão interessado nas explicações do professor Carmona que bombardeei-o com muitas perguntas. Ele respondeu a quase todas, mas algumas confessou que não sabia e que eu deveria procurar um Altamisayo. Disse que havia um, que era o seu mestre, na base do monte Awsangate, cerca de três dias de viagem à cavalo. Informou-me que existem dois tipos de sacerdotes: os Paqos, ou Pampamisayos, e os Altamisayos. Os Paqos são pessoas que trabalham com o mundo dos espíritos, atuam como intermediários entre o plano do Puma e o da Serpente, servem de intérpretes nas relações dos homens com os espíritos e as forças da natureza. Sabem como se relacionar com estas forças, fazer as magias, os despachos, as curas, adivinhação, os rituais e cerimônias. São os feiticeiros, bruxos, curandeiros, magos, xamãs e adivinhos. Os Altamisayos são homens santos que vivem entre o plano do Puma e o do Condor, normalmente vivem isolados das outras pessoas, como eremitas, no alto das montanhas geladas numa vida de total renúncia aos prazeres do mundo. Sua alimentação baseia-se em raízes, folhas e o que consegue obter naquelas montanhas. Vivem num ambiente cuja temperatura fica quase sempre abaixo de zero, vestem-se muito simplesmente, quase sem roupa, e não sentem frio. Vivem nestes lugares isolados em permanente contemplação, fora do mundo dos homens, em contato direto com os planos superiores de consciência. As pessoas das aldeias próximas e os Paqos respeitam muito estes homens e costumam, de tempo em tempo, visitá-los a fim de renovar suas energias, consultar-se e pedir conselhos espirituais. Alguns pedem favores especiais às forças superiores quando a magia dos Paqos não é suficiente para atendê-los. Estes homens não fazem trabalhos e rituais para resolver problemas materiais, são sábios, ou mestres, que as pessoas consultam sobre sua vida espiritual, para pedir conselho e orientação. O professor disse, então, que ele tinha um mestre que vivia numa montanha nevada próxima a Cusco, que se chamava Awsangate. Este homem chama-se Mariano Turpo e era quem o orientava e havia ensinado tudo o que ele sabe. De vez em quando procurava este mestre para renovar suas forças e obter mais ensinamentos. As coisas que estava querendo saber, para as quais o professor Carmona não tinha as respostas, eu deveria procurar Mariano Turpo e falar direto com ele. O que ele soubesse me responderia, caso contrário teria de entrar em contato com o Apu de Awsangate, o espírito da montanha, caso este o permitisse. O professor assegurou-me que na ocasião em que resolvesse ir até Awsangate me daria as informações necessárias para chegar lá e encontrar e ser recebido ´por Mariano Turpo. Lembrei-me da forte emoção que senti pelas montanhas nevadas que encontrei pelas minhas andaças pelas Cordilheiras dos Andes. Sentia uma irresistível atração e fascínio pela solidão do homem sábio, simbolizado pelo brilho alvo, gélido e resplandecente dos seus picos retirados em direção aos céus. Agora tinha outro motivo para me sentir mais atraído ainda por aquelas montanhas: queria conhecer um Altamissayu. Um dia, quem sabe? Estas informações não estão disponíveis em nenhum livro, são transmitidas apenas pelo contato direto com os “Paqos”, que são pessoas que se dedicam ao cultivo e prática no manejo das forças geradas por Pachamama e pelos Apus, espíritos das montanhas. Outras informações que recebi, infelizmente não posso divulgá-las. Quando um paqo ou um Altamissayu transmite um ensinamento a alguém, esta informação é considerada pessoal e confidencial e a sua divulgação é tida como um desrespeito e traição. Segundo o professor Carmona, os paqos estão proibidos pelos Apus de divulgar estes conhecimentos.

1 comentário:

Bronye disse...

Olá!! José Soares

Faz pouco que comecei a seguir seu blog,o que devo dizer,algo que você já sabe pois ele é muito interessante e as postagens devem ser lidas e relidas,pois é deveras apaixonante.
Estou aprendendo muito com você.
Meu obrigada!!!!!
abçs