quarta-feira, setembro 08, 2010

Superação da paralisia corporal por meio da imaginação consciente

Superação da paralisia corporal por meio da imaginação consciente
Cleber Monteiro Muniz

Há casos em que o corpo físico apresenta uma paralisia quando nos deitamos para dormir ou durante o relaxamento profundo. É um fenómeno que pode ser induzido voluntariamente mas que também ocorre espontaneamente com pessoas que nunca ouviram falar em adentrar conscientemente ao sono. Nesse último caso, a paralisia é motivo de medo e angústia.
Por desconhecer a natureza do fenómeno experimentado, o não-iniciado em experiências oníricas conscientes tece julgamentos equivocados sobre a paralisia do sono. Supõe que está morrendo, que está enlouquecendo, que está doente ou, se for supersticioso, pode acreditar que está sendo vítima de uma entidade demoníaca ou que isso é um sinal maléfico indicador de mau-presságio, etc. A falsa sensação de sufocamento ou asfixia que acompanha a imobilidade corporal contribui ainda mais para intensificar o terror.
O medo é injustificado. A fase de imobilidade corresponde à etapa de transição entre a vigília e o sono. É uma catalepsia leve, temporária, natural e inofensiva que corresponde ao primeiro umbral para a dimensão interior desconhecida, um crepúsculo entre a luz e a sombra, como disse Don Juan:
"O crepúsculo é a fresta entre os mundos" (apud Castaneda, p. 93)
A etapa crepuscular da viagem da consciência ao inconsciente nos presenteia com a oportunidade de carregarmos a lucidez vígil para dentro do mundo onírico.
Uma dificuldade do iniciante é ultrapassar a paralisia. Preso à cama, o aspirante fica um bom tempo estancado: não prossegue a viagem e não retorna. A solução encontrada por alguns é abandonar a prática e entregar-se ao sonho usual ou se desesperar para retornar ao mundo vígil.
Por meio da concentração e da imaginação podemos superar essa etapa e prosseguir o trabalho.
Se construirmos, por meio da concentração, uma cena mental em plena letargia e imobilidade do corpo e a vivenciarmos como vivenciaríamos uma cena deste mundo, porém sem perder a recordação de que pertence a uma realidade psíquica e paralela, penetramos conscientemente no mundo interno. A cena construída se transforma em cena onírica enquanto o corpo adormece mais e mais profundamente. Prosseguindo, chegaremos à fase em que a cena não é mais a que criamos voluntariamente. A partir de então as cenas são numinosas, nítidas, densas e se processam e se moldam por si mesmas.
A estratégia para transcender a fase da paralisia é, portanto, simplesmente imaginar um sonho e vivê-lo como tal lucidamente, aguardando os resultados.
O que os desconhecedores da experiência onírica consciente consideram um problema terrível é uma bênção para os aspirantes à mesma, uma oportunidade valiosa e desejável. Alguns anseiam tanto por ela que a afugentam.
A paralisia é natural pois, ao adormecer, o corpo precisa ser desactivado. Todas as funções ficam muito reduzidas. Os movimentos são desacelerados, inclusive os diafragmáticos, cuja redução proporciona a falsa sensação de asfixia. Os únicos movimentos que conservam desenvoltura semelhante à vígil são os das pálpebras. Sob alguns aspectos, o sono é semelhante a um estado de quase-morte. É a inofensiva simulação de um coma que pode ser aproveitada para que nos acostumemos a abandonar o corpo temporariamente, ou seja, esquecer que ele existe e nos concentrarmos mais no universo imaginal. Uma vez bem guardado e seguro, o corpo pode perfeitamente ser deixado de lado sem nenhum problema. Não há nisso nada de místico ou perigoso. O que há de místico em diminuir os movimentos de braços, pernas ou cabeça no sono? É uma função humana natural. Todos sabem que o corpo diminui os movimentos ao dormir. Entretanto, nem todos presenciam conscientemente a diminuição em si próprios.
Quando a letargia penetra no campo de consciência de quem está adormecendo, é percebida como incapacidade de movimentos. Aquele que se percebe paralisado na cama, transportou a consciência vígil a um nível de adormecimento corporal mais profundo do que o usual. Pode, a partir daí, experimentar conscientemente a vida no mundo no mundo dos sonhos e até mesmo atingir lucidamente um nível transpessoal, sendo e sentindo-se temporariamente parte da natureza (rio, águia, rocha, lobo, árvore...) ou vivenciando o papel de heróis míticos ou entes arquetípicos.

Referência bibliográfica:
• CASTANEDA, Carlos. A Erva do Diabo: as experiências indígenas com plantas alucinógenas reveladas por Don Juan. (The Teachings of Don Juan, 1968). Trad. de Luzia Machado da Costa. 12a edição. Record.

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