domingo, novembro 05, 2006

OS SUBLIMINARES E O DEMÔNIO

OS SUBLIMINARES E O DEMÔNIO


Convidado: Ivan Carlo Andrade de Oliveira - Mestre em Comunicação Científica e Tecnológica pela Universidade Metodista de São Paulo. Professor do Instituto Macapaense de Ensino Superior (IMMES) e da Faculdade de Macapá (FAMA)
Você alguma vez já comprou algo que não precisava e depois se perguntou por quê? A razão pode estar nas propagandas subliminares. Subliminar é tudo aquilo que vai direto para o inconsciente. É uma percepção abaixo do nível de consciência. Estudos recentes têm mostrado que essa técnica tem sido cada vez mais utilizada por publicitários para vender os mais variados tipos de produtos.
A explicação fisiológica para os subliminares está na estrutura do olho. Nossa pupila é formada por células bastonetes, que ficam na periferia, e a fóvea, que fica no centro. O que é captado pela fóvea é percebido conscientemente. O que os bastonetes captam, fica como subliminar. Neste momento, por exemplo, sua fóvea está focada nas letras, enquanto seus bastonetes captam o que está em volta (o banner e o menu lateral, por exemplo).
A pesquisa sobre o assunto tornou importante classificar os tipos de subliminares. Descobriu-se que há dois tipos: os sintáticos e os pragmáticos.
Os subliminares sintáticos são aqueles que fazem parte da linguagem da mídia e, na verdade, só ajudam a transmitir uma mensagem que já está expressa. Por exemplo, desenhos eróticos escondidos em uma história em quadrinhos erótica. Na verdade, toda linguagem tem algum tipo de subliminar sintático. Um amigo meu, pesquisando sobre a diagramação de jornais, descobriu que as colunas exercem uma função subliminar, dando ao leitor a impressão de que o texto é menor do que ele realmente é e facilitando a leitura.
Um exemplo maravilhoso de subliminar sintático é o filme 'Clube da Luta'. Durante toda a primeira parte do filme, o personagem de Brad Pitt, Tyler Duder, aparece subliminarmente em várias situações-chave. A função dessas aparições é preparar o leitor para sua aparição posterior e para a revelação de que ele é, na verdade, uma criação do personagem principal, que tem problemas de dupla personalidade. Os subliminares de 'Clube da Luta' são sintáticos, pois só ajudam a contar uma história que já está expressa.
Os quadrinhos também são uma linguagem essencialmente subliminar. Poucas pessoas lêem o texto e os desenhos. Normalmente o foco é dado no texto dos balões e as ilustrações ficam como subliminares.
No outro extremo, há os subliminares pragmáticos. Nesse caso, o subliminar não tem relação nenhuma com a mensagem expressa. É o caso, por exemplo, de um subliminar erótico em um filme infantil, como a mulher nua que aparece em uma cena do desenho animado 'Bernardo e Bianca'.
Enquanto os subs sintáticos têm como objetivo ajudar a transmitir a mensagem, os subs pragmáticos querem levar o receptor a algum tipo de comportamento, geralmente comportamento de compra. Numa analogia, eles são como vírus de computador. Ficam alojados em nosso cérebro, prontos para entrarem em ação no momento certo. Quando a pessoa estiver no supermercado, escolhendo entre várias marcas de refrigerante, o subliminar vem à tona, fazendo-a comprar o refrigerante "X".
Subliminares sintáticos não são prejudiciais e sem eles muitos filmes, histórias em quadrinhos e até novelas, seriam incompreensíveis. Por outro lado, os subliminares pragmáticos são anti-éticos e demandam uma legislação que os proíbam. Sua utilização para vender produtos fere o direito de livre-arbítrio do consumidor, pois ele compra sem saber porque está comprando.
Assunto sério, pesquisado por pessoas sérias, os subliminares virou, recentemente, uma febre. Fanáticos religiosos montam sites e ONGs para denunciar supostos subliminares em músicas, filmes e até histórias em quadrinhos. Como toda linguagem usa subliminares sintáticos, é praticamente impossível encontrar um filme que não tenha subliminares. É prato cheio para que esses fanáticos denunciem a presença de Satã em tudo, de músicas de Roberto Carlos a histórias em quadrinhos do Penadinho.
Alguns são claramente exemplos do que não se pode considerar subliminar. Um site sobre subliminares apresenta como exemplo de subliminares satânicos uma história do Penadinho em que um homem faz um pacto com o diabo. Ora, se o pacto está ali, para todo mundo ver, não há subliminar. O que é consciente não é subliminar.
Em outras situações esses sites forçam a barra o quanto podem para provar que o demônio está dominando o mundo de maneira subliminar. Tocam músicas ao contrário e, quando o resultado não apresenta nada compreensível, como acontece com uma música da Xuxa, inventam que a frase incompreensível é na verdade uma invocação ao demônio em uma língua esquecida que só o dono do site parece conhecer.
Além disso, esses sites apresentam exemplos e mais exemplos de pessoas que teriam cometido crimes influenciadas por um satã subliminar. Exemplo: Na Guatemala uma garota matou os pais depois de assistir a uma fita do desenho animado 'O Rei Leão'. Tais sites não dizem quem é a garota, quando aconteceu o crime, onde, que variáveis podem ter influenciado no comportamento da menina. E, principalmente: não dizem de onde tiraram essa informação. Em outras palavras: picaretagem pura. Como diria Carl Sagan, em uma mundo assombrado por demônios, a ciência verdadeira é uma vela que ajuda a lançar luz sobre a escuridão. Daí a importância de que pesquisadores sérios se debrucem sobre o assunto.

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