quinta-feira, abril 14, 2011

ESOTÉRICO / EXOTÉRICO


ESOTÉRICO / EXOTÉRICO

De génese grega, o adjectivo eksôterikos-on («exterior, destinado aos leigos, popular, exotérico») já existia em grego clássico, ao passo que o adjectivo esôterikos-on («no interior, na intimidade, esotérico») surgiu na época helenística sob o Império romano.
O primeiro testemunho do termo encontramo-lo nos escritos de Luciano de Samosata (aprox. 120 - 180 d. C.), concretamente na sua obra satírica O Leilão das Escolas Filosóficas, § 26, composto cerca de 166 d. C., embora o autor possa ter ido buscar o adjectivo aos seus anteriores doxógrafos, como o peripatético Dicearco (séc. IV a. C.) ou Adrasto (séc. I).
Mais tarde, as palavras eksôterikos e esôterikos passaram a ser aplicadas, por engano, aos ensinamentos de Aristóteles por Clemente de Alexandria (aprox. 150 - 215 d. C.) na sua obra Strômateis, composta cerca do ano 208 d. C. Clemente supunha ser  Aristóteles um iniciado, pelo que seriam «esotéricos» os ensinamentos que facultava no seu Liceu a discípulos já instruídos. No entanto, tratava-se simplesmente de um ensino oral que Aristóteles qualificava como «ensinamento acroamático», isto é, «transmitido oralmente», nada tendo de esotérico no sentido iniciático do termo. Tal conotação será efectuada por Orígenes (aprox. 185-254 d. C.), teólogo alexandrino e discípulo de Clemente, ao contestar as críticas do anti-cristão Celso, na sua obra Contra Celsum: «Chamar oculta à nossa doutrina é totalmente absurdo. E de resto, que haja certos pontos, nela, para além do exotérico e que portanto não chegam aos ouvidos do vulgo, não é coisa exclusiva do Cristianismo, pois também entre os filósofos era corrente haver umas doutrinas exotéricas, e outras esotéricas. Assim, havia indivíduos que de Pitágoras só sabiam “o que ele disse” por intermédio de terceiros; ao passo que outros eram secretamente iniciados em doutrinas que não deviam chegar a ouvidos profanos e ainda não purificados» ( Livro I, 7).
Também Jâmblico (aprox. 240-330 d. C.), filósofo e místico neoplatónico,  se refere aos discípulos da escola pitagórica nos seguintes termos: «Estes, se tivessem sido julgados dignos de participar nos ensinamentos graças ao seu modo de vida e à sua civilidade, após um silêncio de cinco anos, tornavam-se daí em diante esotéricos, eram ouvintes de Pitágoras, usavam vestes de linho e tinham direito a vê-lo» (Vita Pythagorica, cap. 17, 72).
Esotérico traduz, assim, um ensino que, em certas escolas da Grécia antiga, era destinado a discípulos particularmente qualificados, completando e aprofundando a doutrina. Por extensão, diz-se de todo o ensinamento secreto e misterioso, ministrado a círculo restrito e fechado de ouvintes, discípulos ou iniciados (de uma doutrina, de uma escola, de uma seita, de um culto), em conjunto com certas práticas rituais e em sincronia com uma mudança de consciência.
Exotérico, por conseguinte, expressa o ensinamento que, nas escolas da Antiguidade grega, era passível de ser ministrado ao grande público e não somente a um grupo selecto de alunos.
É frequente associar-se esotérico às ciências filosóficas transmitidas oralmente e exotérico às transmitidas por meio da palavra escrita, destinadas ao público, como os escritos aristotélicos, em forma de diálogos, de que só restam fragmentos.
O exotérico é múltiplo e variável, pois os princípios podem expressar-se sob numerosas formas distintas e em diversos níveis; o esotérico, em oposição, é invariável e sintético, dado referir-se àquilo que permanece imutável no tempo e no espaço, às essências subtis das coisas, aos arquétipos ou ideias puras, que transcendem toda a manifestação. Um bom exemplo da distinção entre  o esotérico e o exotérico é a relação existente entre o pensamento e a palavra. Um só conceito pode expressar-se de muitas maneiras e em qualquer idioma, sem que por isso o seu conteúdo varie essencialmente. O pensamento é, pois, anterior e invisível, e a palavra sua expressão formal, múltipla e sensível.

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