O chanceler se apressou em receber pessoalmente o Rei e sua
comitiva.
- Anu, meu irmão, que saudades. – Falou Enlil empolgado
dando um forte abraço no Rei – Devia ter avisado que viria, teria preparado uma
recepção à sua altura.
- Também estava com saudades Enlil, meu irmão. – Respondeu
tristemente Anu. – Mas, creio o motivo de minha vinda a Nippur não seja
agradável ao ponto de merecer uma recepção. Precisamos conversar imediatamente!
O Chanceler encaminhou o Rei para o seu gabinete, enquanto
era preparada a estadia real. Ofereceu-lhe um drink e sentaram-se no
confortável estofado onde o Chanceler gostava de relaxar.
- Muito bem então Anu, mate minha curiosidade. Qual seria o
motivo de sua visita? – Perguntou cinicamente o Chanceler, como se não
soubesse.
- Enlil, você sabe muito bem que, o que fez, seu crime é
gravíssimo. E, você não está acima da lei! – Acusou o Rei.
- Anu, eu não cometi nenhum crime! – Respondeu calmamente o
Chanceler.
- Criar vida artificial é crime inafiançável. E você sabe
perfeitamente, afinal, você mesmo foi o redator desta lei.
- Por isso afirmo que não cometi nenhum crime. Venha comigo,
preciso lhe mostrar algumas coisas em Nippur que vão vou provar que estou
certo.
O Chanceler já havia preparado de antemão um veiculo para
este “passeio”. Foram direto para as aralis, lá Enlil mostrou para o Rei a
precária situação dos trabalhadores, que ainda não dispunham dos Lulus para
ajudar, eles ainda estavam em período de avaliação. Anu aproveitou para cumprimentar
Enki, que na época, ainda estava vivo, e que pode confirmar o que Enlil já
havia falado sobre a situação dos mineiros. Depois foram para a cidade, que
realmente estava agora, graças aos Lulu Amelus, começando a ter aparência de
uma cidade. Mostrou, ao longe, este povo trabalhando, sabia que este era o
motivo da visita do Rei a Nippur, falou sobre sua inteligência e como estão
sendo úteis, e que em breve seriam encaminhados para as minas, para ajudar na
mineração tão vital para manter a vida em Nibiru.
- Como pode ver Majestade – falou orgulhosamente Enki -, os
Lulu Amelus são imprescindíveis para o desenvolvimento de Nippur e para
salvação de Nibiru. Sem eles, estaríamos fadados certamente à extinção.
- Vejo que estes novos seres são, realmente, bastante úteis
– respondeu o Rei –, mas isso não o inocenta por ter infringido a lei.
- Me desculpe, meu amigo, mas discordo. – Contestou Enlil -
Em nossa constituição, existe uma cláusula, escrita pelos nossos pais. E ela me
inocenta.
Enlil estava se referindo ao parágrafo que cita: “No
iminente risco de extinção dos Anunnakis, poderão ser utilizados quaisquer
meios possíveis, mesmo que contra a Lei Ambiental, desde que não haja outra
solução possível e imediata”.
- Eu conheço bem as nossas leis Enlil. – Falou o Rei – E não
vejo risco de extinção iminente para nosso povo.
O Chanceler levou o Rei para a espaçonave que estava pronta
para levar o minério extraído para Nibiru. Seu compartimento estava carregado
com apenas metade da carga suportada.
- Em todo este ano de Nibiru, somente conseguimos esta
ínfima quantidade de minério. – Falou o Chanceler – O que tem aqui não é
suficiente para manter nossa proteção térmica por mais de um ano, teremos que
utilizar nossas reservas estratégicas. Agora as condições de mineração estão
ainda piores, para o próximo ano, sem os Lulu Amelus, extrairemos ainda menos.
Este planeta é muito gelado e nossos equipamentos, que possuem processador
biológico não resistem ao frio, e nossa espécie, você sabe, também não. Sem a
ajuda dos Lulu Amelus, e sem uma solução definitiva para o problema em nossa
proteção térmica, fatalmente entraremos em extinção. – O Chanceler olhou com
reprovação para o Rei, e concluiu. - Nossas reservas estratégicas suportarão
até quando a falta de reposição?
O argumento foi convincente, Enlil estava certo. Havia risco
para o povo Anunnaki, e depois da descoberta da abundância nas jazidas de
Nippur, houve grande euforia e foram cortadas as verbas para pesquisa de uma
solução definitiva para o problema da proteção térmica. Ninguém supunha quão
difícil seria a extração do material. Ficou claro que, sem a criação dos
trabalhadores não conseguiriam prosseguir com a mineração e, como conseqüência,
seu planeta, e eles próprios, corriam sérios riscos.
O Rei sentiu um grande alivio em descobrir que Enlil estava
certo. Não precisaria mais prende-lo e, agora, finalmente, pode relaxar e
apreciar as belezas de Nippur, como o seu belíssimo e insólito, céu azul.
Ainda em Nippur, o Rei assinou uma lei regularizando a
situação dos Lulu Amelus, mas incluiu uma ressalva: "Jamais poderiam ser
levados para Nibiru. Deveriam permanecer trabalhando somente em Nippur".
Com esta lei, muitos Anunnakis se candidataram para vir a Nippur. As últimas
espaçonaves foram concorridas, situação que não acontecia antes. Agora iriam
receber pela colonização, sem precisar realizar nenhum trabalho braçal, já que
os Lulu Amelus os realizarão.
O Rei Anu se despediu com a certeza de que Nippur estava
sendo bem cuidada por Enlil, e que não precisaria intervir.
Enlil soube por suas fontes que foi Anzu quem enviou
escondido, um cristal de dados para um amigo seu em Nibiru, amigo este que
também faz parte do mesmo grupo de ambientalistas que Anzu. Este incidente
quase acabou com os planos de Enlil, que só conseguiu escapar, não só ileso,
como fortalecido, graças a sua astúcia política.
O Chanceler inclina-se para trás em sua confortável poltrona
e fala para si.
- É Anzu, você ainda vai pagar pelo que fez... ainda tenho
planos para você. Aguarde!
Ninsun aproxima-se cuidadosamente da caverna.
Chega escondida, olhando em todas as direções tentando
descobrir se não é uma armadilha, não vê ninguém. Respira fundo, toma coragem e
entra na caverna. O Anunnaki continuava no mesmo lugar, deitado em um canto.
Ela pega sua lança, que havia perdido no chão da caverna e vai, aos poucos,
chegando mais perto, mas, sempre pronta para correr, se preciso for. O
Anunnaki, penosamente, abre os olhos e tenta falar, mas não consegue. Ninsun
lhe toca a testa, e constata. – Ele está febril!
- O que houve com você? – Pergunta temerosa ao convalescente
Anunnaki. Ele, juntando o que resta de suas forças, simplesmente, aponta para
seu abdômen.
Ninsun ergue a roupa do moribundo e constata chocada. – Ele
está ferido.
O Anunnaki apresenta um machucado grande na altura de sua
barriga. Já deve tê-lo sofrido há algum tempo, pois está bastante infeccionado,
provavelmente é a causa da febre. Ninsun pega seu cantil e derrama um pouco de
água na boca do Anunnaki.
- Ele estava com sede, como Gil sabia? – Pensou
Mas não havia tempo, o Anunnaki estava muito mal, ela tinha
que ser rápida, ou certamente, ele morreria. Imediatamente, saiu da caverna e
trouxe algumas ervas e uma esponja natural, da mesma que usa para desencardir
Gil. Joga um pouco de água na ferida e esfrega com a esponja para limpar o
ferimento. O Anunnaki geme de dor. Com a ferida bem limpa, Ninsun faz um
curativo com ervas cicatrizantes.
Conhecera estas ervas com os kerabulus, e usava
constantemente nos machucados conseguidos por seu filho. Acendeu um fogo e, em
uma jarra de barro, colocou uma mistura de ervas antiinflamatória enquanto
fazia uma compressa com água fria na testa do Anunnaki. Precisava ser
cuidadosa, sabia do perigo de hipotermia. Os Anunnakis são muito sensíveis ao
frio.
Quando a febre baixou, e o Anunnaki adormeceu, Ninsun voltou
para cuidar de Gil.
Sua vida se transformou nesta rotina, de ir e vir entre uma
caverna e outra. E, as cavernas não ficam próximas. Mas, planejou mantê-la até
a recuperação do Anunnaki. Não iria mostrar Gil para o ele, e, também não
poderia deixar Gil sozinho – Nippur é um planeta selvagem e perigoso.
Os dias foram passando, e o Anunnaki já apresentava claros
sinais de melhora, apesar de que, demoram mais que os Lulus para se curar.
Graças aos cuidados de Ninsun, agora, já consegue até comer sozinho e pôde,
finalmente, agradecer pelo que Ninsun fez.
- Obrigado. – Disse o Anunnaki – Você salvou minha vida,
serei eternamente grato!
- O que faz aqui? – Perguntou rispidamente Ninsun.
- É uma longa história.
- Felizmente não terei tempo para ouvi-la. Assim que estiver
em condições de buscar seu próprio alimento, eu irei embora. – Virou-se e olhou
para o Anunnaki com cara de ameaça. – Espero que possa retribuir o favor não contando
a ninguém sobre mim.
Ninsun sai da caverna em busca de um pouco de água fresca
para o Anunnaki, ela sabe que eles não são confiáveis, e não vê à hora de ir
embora com Gil. Iria bem para o norte, onde é bem frio e longe dos Anunnakis.
Gilgamesh é uma criança obediente, mas como toda criança, é
extremamente curioso. Precisava ver com seus próprios olhos, como era o tal
Anunnaki e, pensou, não teria outra oportunidade.
Neste dia seguiu de longe a sua mãe, que foi em direção a
caverna do moribundo. Ela entrou por alguns minutos e ele ficou observando
escondido fora da caverna. Sua mãe saiu em direção à floresta - Deve estar indo
buscar água. - Pensou. Era a hora que estava esperando.
Saiu do esconderijo e correu em direção à caverna.
Ao entrar, parou de repente, o que vira o deixou perplexo. O
que é diferente do habitual sempre nos causa estranheza. Gil levou um susto, o
Anunnaki também se assustou, porque Gilgamesh também é diferente, diferente
dele e diferente dos Lulus. Possui as características físicas dos Anunnakis,
porém havia cor em sua pele e cabelos.
O Anunnaki pensou em falar algo, mas, não teve tempo. Da
mesma forma que Gil entrou correndo, Gil saiu correndo, e o Anunnaki ficou ali,
se perguntando:
– Que criatura será esta?
Minha estada na pitoresca cidade Catarinense está muito
agradável.
Finalmente tive sossego para me dedicar à tradução das
tábuas. Estou hospedado, com nome falso e sem cabelos e barba, em um bom hotel
e me apresento a quem perguntar, e muitos perguntam, como tradutor de obras
literárias, o que não é totalmente mentira. Tudo estava correndo bem até que,
constatei algo que me deixou terrivelmente preocupado.
Meu dinheiro está acabando.
Busquei na memória quais habilidades poderia usar para
ganhar algum dinheiro, sem precisar me identificar. Sempre trabalhei na área
acadêmica e com tradução de textos antigos, e, para ambos, é preciso apresentar
os diplomas e credenciais, o que está fora de cogitação.
Divagando em pensamentos, comecei a questionar sobre as
utilidades práticas de meus conhecimentos. Nosso trabalho diário, rotineiro,
não é uma coisa que pensamos normalmente, simplesmente o fazemos. Perguntei a
mim mesmo se, o que fiz até agora e todos os conhecimentos adquiridos durante
minha vida tinham, de alguma forma, alguma utilidade prática para o mundo e
para evolução humana.
Passamos boa parte de nossas curtas vidas estudando,
adquirindo conhecimento, para depois, nos empregarmos, se tivermos sorte, em
alguma grande empresa, onde passamos o restante de nossa curta vida,
trabalhando em pró de algum ganho financeiro, às vezes bom. Mas muitas vezes,
que nem sequer dá para pagar nossas contas. Mas mesmo assim, continuamos
trabalhando.
E se ocorresse uma catástrofe, algo que precisássemos a todo
custo sobreviver. Um momento em que todo conhecimento e habilidades tivessem
como ponto focal a manutenção da vida. Será que meu conhecimento, aquilo que
sempre fiz, no dia-a-dia, teria alguma valia? Toda aquela minha experiência,
que exponho, orgulhosamente, em seu “curriculum vitae”, teria alguma utilidade
prática?
Parece que algo invisível, sinistramente oculto, nos
empurra, mesmo sem que queiramos, mesmo sem sabermos o motivo, mas, nos
empurra, para desempenharmos aquilo que não gostamos e que não desejamos fazer
o resto de nossas curtas vidas, mas que, por alguma razão, precisamos fazer...
e sempre continuamos fazendo.
- Nossa. Lançaram um novo modelo de carro que preciso
comprar! Mas... eles não lançam sempre?
***
O Anunnaki estava se recuperando muito bem, e agora, já
podia até, sair da caverna e, mesmo com alguma dificuldade, se virar sozinho.
Ninsun veio vê-lo pela última vez, já havia arrumado tudo para seguir,
juntamente com seu filho, para bem longe. Havia extraído bastante sal, e não
pretendia voltar, nunca mais, a esta praia.
- Então é isso - falou ela ao Anunnaki -, agora é por sua
conta. Adeus!
- Como assim adeus - respondeu o Anunnaki -, porque vai me
abandonar?
- Eu já fiz minha parte, agora já pode cuidar de si próprio.
- Para onde vai?
- Não é da sua conta.
- Então, deixe-me acompanhá-los?
- Como acompanhá-los. – Respondeu Ninsun nervosa - Eu estou
sozinha aqui!
- Sozinha com seu filho?
O Anunnaki não tinha certeza de que o estranho menino que o
visitou na caverna era realmente seu filho, apenas jogou a isca. Sabia que não
conseguiria sobreviver sem ajuda nesta parte do planeta, ainda mais porque não
estava totalmente recuperado, e também, porque não tinha a mínima idéia de como
voltar para Eridu.
Ninsun mostrou-se visivelmente nervosa com o que o Anunnaki
falou. - Como ele pode saber sobre Gil? – Pensou, mas tentou disfarçar.
- Não sei do que você está falando!
- Ele é um hibrido, não é? Eu sabia que, mais cedo ou mais
tarde, isso iria acontecer...
Neste momento Ninsun nem pensou.
Como uma fera selvagem, pulou ferozmente sobre o Anunnaki.
Apesar de bem menor, conseguiu derrubá-lo. Ele não esperava pela sua reação, e
também, não estava totalmente recuperado. Com ele no chão, Ninsun encostou a
ponta de sua faca de sílex no pescoço do Anunnaki, e falou:
- Se acontecer qualquer coisa com meu filho eu te mato. Eu
juro que te mato!
- Sei que você não mata. – Respondeu o Anunnaki com certo
receio - Vocês, os Lulus, são seres de bom coração, jamais matariam. Não se
preocupe, jamais esquecerei o que me fez. Nunca deixarei que façam nada de mal
com você ou com seu filho. Eu prometo!
Ele estava certo. Ninsun não lhe faria mal, mas, sabia que
não poderia confiar no Anunnaki e que, a única chance que tinham era ir o
máximo possível para o norte, agora com cuidado redobrado. Ela foi tirando
lentamente a faca do branco pescoço do Anunnaki e, sem parar de encará-lo,
começou a levantar.
Ninsun já estava quase em pé, sempre apontando a faca de
sílex para o enorme ser albino, que também já começava a levantar. De repente,
quando menos esperava, o Anunnaki sente uma dor terrível em sua cabeça.
É atingido por uma forte pancada, e cai novamente no chão.
Indefeso, gemendo de dor.
- Nebo, o que tem dentro deste quarto? – Pergunta Lizi,
curiosa em relação ao aposento da casa que ninguém entrava.
- Aqui eu montei um pequeno CPD em Nippur. Venha eu te
mostro. – Respondeu Nebo, sempre carinhoso.
O CPD, ou Central de Processamento de Dados, é o lugar onde
Nebo guarda, cuidadosamente, o servidor central onde, antes da construção dos
geradores pirâmide, fazia backup das informações de todos os computadores de
Nippur, para caso de problemas com o frio, que batizou de “Grande Cérebro”. Com
toda a atenção e amor, Nebo mostrou a Lizi o seu funcionamento e como
utilizá-lo.
- Ainda está copiando arquivos dos computadores de Nippur? –
Perguntou à curiosa Lizi. Aliás, ela se mostrou a companheira ideal para Nebo,
além de carinhosa, divertida, ainda gostava muito de informática. Podemos dizer
que Nebo “juntou o útil ao agradável”.
- Sim meu amor, ainda está copiando os arquivos, achei mais
seguro. Nunca se sabe quando um computador biológico vai morrer.
- E você já viu os arquivos gravados aqui?
- De forma alguma. – Respondeu rapidamente Nebo - Seria
anti-profissional, além de antiético. Os arquivos, apesar de estarem aqui na
nossa casa, são de seus proprietários. – Nebo sempre fora muito profissional, e
se orgulhava disso.
- Você tem razão querido. – Falou Lizi, meio envergonhada - Mas
que dá curiosidade, dá!
- Com o tempo passa, e você nem se lembra que os arquivos
existem. – Concluiu Nebo com um largo sorriso em seu rosto.
***
Ninsun não imaginava que Gil estava vendo tudo, escondido
atrás de uma árvore.
Ao ver a mãe ameaçando aquele ser estranho e albino, não
hesitou. Passou a mão em um pedaço de madeira e correu ao encontro dos dois, no
intuito de ajudar sua mãe. O Anunnaki foi surpreendido com uma paulada em sua
cabeça. Gil ainda é uma criança, mas está maior que sua mãe, em tamanho e, é
muito forte.
Realmente a paulada machucou. Mas, ele não conteve seu
ímpeto, continuou batendo no Anunnaki com o pedaço de madeira, mesmo ele já
estando caído.
- Pare com isso Gil! – Gritou sua mãe, enquanto o Anunnaki
rolava pelo chão, tentando inutilmente, se livrar de Gil.
Ninsun precisou de muito esforço para conter a fúria de seu
filho. Precisou até se colocar entre os dois obrigando Gil a parar. Depois de
controlá-lo, teve ainda que cuidar dos novos ferimentos do Anunnaki
- Você é muito forte meu amigo... ai! – Reclamou o Anunnaki
a Gil, enquanto Ninsun limpava o novo ferimento em sua alongada cabeça.
Gil não respondeu. Estava sentado na areia olhando
desconfiado para o estranho. Ele pressentia, de alguma forma, que podia confiar
no Anunnaki, mas ao ver sua mãe brigando, não teve dúvidas sobre qual lado
escolher.
- Gil é um guerreiro. – Falou Ninsun. – Nasceu de uma mãe
guerreira, e só está aqui hoje graças a esta garra!
- Qual é a história de vocês dois? – Perguntou o Anunnaki –
Ai! Cuidado, está doendo...
- Fala como se não soubesse! – Respondeu Ninsun esfregando o
corte com raiva o que fez o Anunnaki gemer de dor. – Pronto, não vai
infeccionar! – E sai brava, puxando Gil pelo braço, para a caverna no alto do
morro, local onde estavam escondidos.
A noite foi longa para Ninsun, equipada com os óculos de
visão noturna que trouxe em sua fuga, passou a noite toda observando se o
Anunnaki não os seguira. Sabe que eles não dormem todas as noites como os
Lulus.
O dia clareou e nada do Anunnaki. Vários dias passaram sem
que Gil e o Anunnaki se encontrassem novamente. Ninsun continuou realizando
todo o trajeto para cuidar dos dois, e passava as noites em claro, vigiando.
- Mãe, você está muito abatida. – Falou Gil preocupado. –
Precisa descansar!
- Tem razão Gil. Fazem varias noites que não durmo. -
Respondeu Ninsun - Estou exausta!
- Porque não dorme um pouco, agora ainda está dia e não tem
perigo. Eu fico de guarda.
– Estou precisando mesmo. Então tá. Fique de olho, e
qualquer coisa me acorde. – E concluiu - Nada de sair da caverna. Aproveite
para fazer sua lição, estamos relaxando muito com seus estudos.
- Tudo bem, mãe. Pode dormir sossegada.
Nem bem deitou e Ninsun já adormeceu, estava realmente muito
cansada.
Quando acordou, achou que havia dormido apenas alguns
minutos, mas olhando para fora da caverna, descobriu que já estava escurecendo.
Olhou para os lados e não viu Gil. Apreensiva, o chamou:
– Gil! – Nada de resposta – Gilgamesh! – Repetiu e nada de
ser atendida.
Levantou-se num pulo, e saiu desesperada a sua procura. Nem
perdeu tempo e começou pela caverna do Anunnaki, e como já desconfiava, lá
estava Gil.
- Eu não te falei para não sair da caverna! – Gritou com
Gil.
- Eu sei mãe, só vim para me certificar se ele não precisava
de nada. Ele ainda está ferido. – Falou Gilgamesh com um tom carinhoso - Além
do mais, já terminei toda a lição!
- Seu filho é maravilhoso! – falou o Anunnaki.
- É eu sei. Por isso mesmo, preciso protegê-lo... de vocês!
Depois de muito discorrer sobre o assunto, cheguei a uma
conclusão bombástica: não sei ganhar dinheiro.
Muitos colegas já haviam falado sobre isso comigo, sobre
como eu, com meu conhecimento e anos de estudo, deveria estar em uma
universidade maior, certamente em outro país, ganhando em Euro. Mas gostava de
onde lecionava, me sentia feliz e, para mim, era isso que importava.
Agora, no entanto, não possuo nem minhas aulas, e meu
acanhado salário de professor. Não imaginei nada que pudesse fazer para levantar
algum recurso, pelo menos, nada que conseguisse utilizar meus conhecimentos.
Minha única idéia foi vender o que possuo de valor em meu
apartamento. Teria que vender qualquer coisa que não houvesse a necessidade de
transferência de documentação, como carro ou o próprio apartamento, este
realmente, não tenho nenhuma intenção em vender. Em meu apartamento, possuo
muitos eletrônicos e algumas obras de arte, não muito valiosas, mas que, com a
venda, poderia levantar algum dinheiro.
Mas como vender sem voltar a Curitiba?
Teria que pedir ajuda, e a única pessoa que lembrei, e que
sei com absoluta certeza que me ajudaria sem pestanejar, é minha amiga Mari.
Comprei um cartão telefônico, fui até um orelhão próximo e
fiz a chamada.
- Alô. – Falou a pessoa.
- Alô, Mari? – Perguntei.
- Sim, quem está falando?
- Val sou eu, Prawdanski!
- Prawdanski? Por onde você anda? Fiquei preocupada, achei
que haviam te capturado!
- Não, eu consegui fugir... preciso te pedir um favor.
***
Os dias foram passando e Ninsun foi relaxando.
Agora já deixava Gil e o Anunnaki juntos, mas estava sempre
de olho e, para dormir, sempre levava Gil até a caverna no alto do morro
deixando o Anunnaki próximo a praia. Começou a entender que o Anunnaki
precisava realmente de sua ajuda, e que, por enquanto, não faria mal a Gil,
aliás, tentava a todo custo ser amigo dele, talvez porque lhe seja familiar,
afinal, o pai de Gil é um Anunnaki. Ela precisava descobrir mais sobre o
estranho, e saber como e porque chegou até aqui. Mas, precisava ser cautelosa,
os Anunnakis são, por sua natureza, dissimulados. Aproveitou à hora da refeição
para tentar, sutilmente, levantar alguma informação.
- Me diga uma coisa – perguntou Ninsun -, como se feriu
tanto? Se não o houvéssemos encontrado, certamente estaria morto!
- É verdade. E serei eternamente grato pela sua bondade. –
Respondeu formalmente o Anunnaki – Já estou perdido há muito tempo, e me
machuquei tentando voltar para os meus, para a Eridu.
- Eridu? – Perguntou Gil – O que é Eridu?
- Eridu é uma cidade Anunnaki, aqui em Nippur! – Respondeu o
Anunnaki.
- Cidade? – Perguntou Gil ficou curioso.
Sua mãe sempre lhe falou das grandes cidades de Nibiru, mas
nunca lhe falou sobre uma cidade em Nippur, e o motivo era simples: a
curiosidade de Gil, que certamente o levará para lá.
- Sim Gil, existe uma cidade aqui perto. – Respondeu o
Anunnaki.
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